Edição nº 46
Diálogos com o Mestre
A tragédia
| A linguagem dos sinais
- O que é a linguagem do sinais?
- Todo homem tem uma maneira pessoal
de comunicar-se com Deus e com sua própria alma.
- Então, o homem não
precisa da religião?
- As religiões são muito
importantes, porque nos permitem adorar de forma coletiva, e compartilhar
dos mesmos mistérios. Mas a busca espiritual é responsabilidade
de cada um: se você afastar-se do seu caminho, nada vai adiantar
ficar culpando o padre, o imã, o rabino, o pastor - a responsabilidade
é sua. Por isso existe um alfabeto que sua alma entende,
e que vai mostrando as melhores decisões em seu caminho.
- Como aprender esta linguagem?
- Como qualquer outra. Primeiro, com
disciplina para educar-se a notar o sinal. Depois, com coragem para
praticar a língua. Terceiro, nunca ter medo de errar enquanto
pratica.
- O que faz com que a gente muitas
vezes siga o sinal errado.
- Claro. Só assim aprendemos
os sinais certos.
- Você podia me dar um exemplo
de um sinal?
- Não. A linguagem é
individual, como disse antes. Se começamos a generalizar
os sinais, eles se transformam em superstição.
"Muitos mestres já cometeram
o erro de usar os seus sinais para guiar seus discípulos.
O que acontece é que, quando as pessoas começam sua
busca espiritual, entram num mar desconhecido, e sentem-se inseguras.
Então procuram agarrar-se à primeira mão que
lhes é estendida - e ao fazer isso, estão deixando
de lado a aventura, para tornar-se escravas da mão que as
guia. "
- Como posso ter certeza que estou
diante de um sinal verdadeiro?
- Você nunca pode. Mas, em geral,
se começar a enxergar este mundo além das convenções,
verá que sua intuição começa a conduzi-lo
em direção à melhor escolha - por mais absurda
que pareça. Aos poucos, esta linguagem se incorpora a você
e, embora continue errando de vez em quando, já está
em paz com sua alma, e toma as decisões corretas.
"Muitas vezes o sinal é
mais prático do que imaginamos, e a propósito disso,
vou lhe contar uma história.
"Um homem sonhou certa vez com
um anjo, que lhe dizia: amanhã vai começar a chover,
sua aldeia será inundada, mas você será salvo.
"Efetivamente, no dia seguinte
começou a chover. Uma equipe de socorro visitou casa por
casa, evacuando os habitantes, já que havia risco de inundação.
Todos saíram, menos aquele homem, que dizia à defesa
civil: "Eu sonhei com um anjo, e ele disse que seria salvo."
"Um dia depois, a água
já cobria o primeiro andar das casas. Uma segunda equipe
de socorro foi tentar resgatar o homem, que de novo se recusou a
sair, alegando que tinha recebido o sinal de um anjo, e precisava
mostrar sua fé ao mundo.
"No terceiro dia, a situação
já era crítica, e o homem estava sozinho, encarrapitado
no telhado da casa - enquanto a água subia sem parar. Num
esforço desesperado, uma equipe de resgate tentou mais uma
vez retira-lo dali, mas de novo ele se negou, chamando-os de demônios,
gritando que queriam obriga-lo a negar o sinal do anjo.
"Pouco tempo depois, a água
cobriu o telhado, e o homem morreu afogado. Como era um ótimo
cristão, foi para o Céu, e encontrou São Pedro,
que o convidou para entrar. O homem recusou-se, dizendo que Deus
o havia enganado; tinha enviado um anjo dizendo que ele seria salvo,
quando na verdade fora o único habitante da aldeia que havia
morrido.
"São Pedro disse que Deus
não mentia, e prometeu voltar com explicações.
Entrou no Paraíso e retornou meia hora depois, dizendo:
""Realmente Deus mandou
um anjo para avisar-lhe que seria salvo. Mas disse que o senhor
recusou, por três vezes, o socorro que Ele lhe enviou sob
a forma de equipes de resgate!""